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Archive for Novembro, 2009

Suma teológica, 1, II, q. 18, a.1:

“Fala-se da bondade e da maldade das ações como se fala da bondade e da maldade das coisas, porque há correlação entre estas e as suas coisas. Ora, cada coisa é boa na mesma medida em que é, pois o bem e o ser se equivalem, como já se disse na primeira parte. Só Deus, porém, possui toda a plenitude do ser por causa da sua unidade e simplicidade, ao passo que as criaturas possuem a plenitude do ser que lhes convém de modo múltiplo. Assim, umas possuem o ser de modo relativo e, contudo, falta-lhes algo à plenitude de vida. A plenitude do ser humano, por exemplo, implica a composição de alma e corpo, com todas as potências e instrumentos do conhecimento e do movimento; por isso, a quem faltar um desses elementos, faltar-lhe-á algo da plenitude do seu ser. Quanto tiver de seu ser, tanto terá de bondade, e, na medida em que lhe faltar algo da plenitude de seu ser, lhe faltará a bondade e será considerado mau. Assim, para um cego é bem o viver e mau o estar privado da vista. Se, porém, não tivesse nenhum ser ou nenhuma bondade, não poderia considerar-se mau nem bom. Como, porém, da essência do bem é a plenitude do ser, o ente a que faltar a plenitude que lhe é devida não será considerado bom absolutamente, mas relativamente, enquanto ser. Poderá ser, contudo, considerado ser absolutamente e não-ser relativamente, conforme se disse na primeira parte. Assim,pois, devemos concluir que toda ação, na mesma medida em que é, é boa; e lhe faltará a bondade, sendo por isso considerada má, na medida em que lhe faltar algo da plenitude do ser devida. Por exemplo, se lhe faltar a quantidade determinada exigida pela razão ou o lugar devido ou coisa semelhante”.

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Tendo em vista a diferença entre virtude natural e sobrenatural para Tomás de Aquino e relevância desta para a ética, veremos em qual sentido, primeiramente, tal diferença ganha corpo na relação entre a moralidade e a bem-aventurança.

Aceitemos, pois, que tudo que é aspira por natureza à auto-conservação e perfeição, logo, o fim último do ser é a sua própria perfeição, i.e., a realização melhor possível de seu ser, de sua natureza. Se realizar o próprio ser é a expressão ontológica do fim último, a expressão ética seria a realização do supremo bem. Segundo Aristóteles, o bem é aquilo que todos apetecem. Ora, se a felicidade é o fim ao qual tende o apetite natural de todo ser vivo, então o fim último, o bem supremo, será a própria felicidade. Segundo Tomás, “o princípio primeiro no operativo, do que existe como razão prática, é o fim último. Mas o fim último da vida humana é a felicidade ou a beatitude (Suma Theol., II, 1, p. 90)”. Logo, temos que, para Tomás, perfeição, beatitude e felicidade coincidem, ou seja, são todos o bem supremo, o fim último. Em outros termo, podemos entender que o principio primeiro no operativo, i.e., eficiente, a causa primeira de nossa ação é o fim último da razão prática. O que conclui em fazer, assim o conclui a razão prática tendo em vista a felicidade; justamente tal conclusão é o início da ação, portanto, princípio motor da ação.

Todavia, a inclinação do homem para a felicidade não se realiza por completo nas coisas criadas, pois nelas se encontra apenas uma parte do bem. O conjunto de todos os bens se encontra em Deus, que acalma por completo esse anseio por ser feliz do homem. Deus, o bem perfeito acalma o apetite, pois não há mais nada além a desejar. Logo, o bem universal não se encontra em nada criado, mas apenas em Deus. E todos aqueles que se esforçaram para serem virtuosos, são gratificados com um sinal: a visão santificante de Deus, considerada como o fim transcendente da perfeição. Só os pecadores não podem ter tal visão. Assim, temos, por um lado, os beatos e, por outro, os maus. Os bons triunfam sobre os maus eternamente. Ou são gratificados com a bem-aventurança os bons, ou são condenados eternamente os maus. Desse modo, a bem-aventurança e a condenação eterna constituem o fim transcendente de ordem ética.  Enfim, a única coisa que pode separar o homem de Deus definitivamente é o pecado mortal, e não os pecados mais leves, que apenas desviam o homem da direção fundamental de sua inspiração a Deus. Nas palavras de Tomás: “Assim como há uma vontade nos homens, assim há uma inclinação natural nas coisas naturais. Se, pois, de alguma coisa natural finda sua inclinação ao fim, não se pode, em absoluto, alcançar este fim; assim como um corpo pesado, se por corrupção perder sua gravidade e se converter em leve, não chegaria ao termo médio; mas se fora impedido em seu movimento, de modo que permaneça a sua inclinação ao fim, uma vez suprido o impedimento, ele chegará ao seu fim. E aquele que comete o pecado mortal, a inclinação da vontade se separa totalmente do fim último; enquanto que aquele que comete um pecado venial, nele permanece a intenção dirigida ao fim, mas de certo modo se encontra impedida, pelo fato de que se aproxima mais do que é devido as coisas que tendem para o fim. Portanto, aquele que comete pecado mortal, merece a pena de ser excluído em absoluto da consecução ao fim; enquanto que quem comete pecado venial, merece sofrer alguma dificuldade antes de chegar ao fim (C. Gentiles, III, c. 143)”.

 

BIBLIOGRAFIA
Material de Apoio
Matheus Venâncio, 2009 – UNIFRAN – Universidade de Franca
2.Semestre Graduação Filosofia

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Como vimos, Aristóteles nos explica o surgimento do estado a partir das organizações familiares. Tratemos agora das partes dessa estrutura familiar. As duas partes que foram exploradas mais extensamente foram a relação entre senhores e escravos e a aquisição da riqueza. Com relação à escravidão (Política, I, 3-7), duas opiniões são correntes em sua época: (i) a opinião de que as regras sobre a escravidão são as mesmas que as regras políticas, sendo, portanto, uma instância de regras normais de superiores sobre inferiores. E (ii) a opinião de que a natureza não reconhece qualquer distinção entre senhores e escravos, logo, a escravidão é fruto de uma convenção anti-natural e injusta. Diante dessas duas opiniões, Aristóteles, como é próprio de um filósofo, examina primeiramente a essência do escravo. Em essência, ele é um instrumento de conduta de vida; em outras palavras, é a posse de um ser vivo. Porém, o escravo não é um instrumento de produção, e sim de ação, i.e., não está a serviço de produzir um artigo em particular, mas para ajudar na administração da vida. O que está em questão, portanto, é antes a escravidão doméstica e não a agrícola ou industrial.

Cabe agora perguntarmos se existe alguém que tende por natureza a cumprir tal papel. Como resposta, Aristóteles nos diz que a antítese superior-inferior é encontrada em todos os lugares na natureza, como entre a alma e o corpo, o intelecto e o apetite, entre o homem e o animal, o homem e a mulher, e se tal diferença existe, é para vantagem de ambos que um deve mandar no outro. A natureza tende a produzir tal distinção entre os homens, fazendo de uns fortes para o trabalho e de outros aptos para a vida política. Logo, alguns homens são livres por natureza e outros, escravos.

Devemos acrescentar que, na época de Aristóteles, muitos escravos assim o eram por serem vencidos na guerra, e tal tipo de escravidão não deveria ser aprovada. Aqueles que sustentam que um tipo de justiça se encontra nos costumes e que, portanto, a escravidão de acordo com o costume de guerra é justificado, esses devem hesitar na justificativa para se escravizar pessoas bem nascidas, mas que foram vencidas na guerra. Isso porque, aqueles que defendem escravos de guerra, ao mesmo tempo, justificam a escravidão na inferioridade da natureza. Se há inferioridade, então a escravidão é de interesse de ambos senhor e escravo.

Claro que é lamentável, mas não surpreendente que Aristóteles tenha defendido a opinião de que a escravidão pertence à natureza das coisas, pois fazia parte da estrutura familiar grega ter escravos. Notemos, pois, que a escravidão na Grécia está distante dos abusos que sofreram os escravos de Roma; sofrimento por escravidão que, inclusive, ainda em nossos dias encontramos.

Algumas condições para se aceitar a escravidão devem ser cumpridas segundo o filósofo: (i) não é fácil distinguir o homem livre por natureza e o escravo por natureza, nem mesmo uma criança que tenha uma natureza escrava terá sempre tal natureza (Política, 1254b32-35, 1255b1-4). (ii) A escravidão por mero direito de conquista em guerra não deve ser aprovada. O poder bélico superior não significa sempre uma excelência superior. E, em nenhum caso, os gregos deveriam escravizar os próprios gregos. Por tais opiniões ou restrições, melhor dizendo, Aristóteles foi considerado revolucionário para época, por mais que nos pareça reacionário. (iii) Os interesses do senhor e do escravo são os mesmos. O senhor, portanto, não deve abusar de sua autoridade. Ele deve ser amigo do escravo. Ele não deve apenas comandar, mas raciocinar junto com o escravo, ou melhor, fazer com que o escravo acompanhe o seu raciocínio. (iv) A todos os escravos deve ser dada a esperança de emancipação (Política, 1330a32).

O que não podemos considerar um ganho na visão política de Aristóteles é o corte que ele faz em dois níveis de raça humana, estabelecendo uma gradação de superioridade à inferioridade com relação à moral e às qualidades intelectuais. A partir dessa visão, seríamos conduzidos a um sistema político-social de subordinação. De qualquer modo, para o filósofo, o escravo não deve ser tratado como um instrumento vivo. O escravo não é apenas um corpo, mas um ser com raciocínio. E, por ter sua razão subordinada ao senhor é capaz não meramente de obedecer, mas de acompanhar um argumento. Também diz o estagirista, que o escravo, enquanto escravo, não pode ser amigo do senhor, mas enquanto homem sim.

 

BIBLIOGRAFIA
Matheus Venâncio, 2009 – UNIFRAN – Universidade de Franca
2.Semestre Graduação Filosofia

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